terça-feira, 6 de setembro de 2022

O que é o Lean Office?


Para a compreensão do que é Lean Office, faz-se necessário primeiramente que haja o entendimento a respeito do que é Lean Management. De maneira sintetizada, este termo é oriundo do Sistema Toyota de Produção, vertente produtiva que passou a ser conhecida mundialmente na década dos anos 1970. Dentre as principais características atribuídas a este sistema de produção estão o combate aos desperdícios e a melhoria contínua (Graban, 2013; Omotayo, Boateng, Osobajo, Oke & Obi, 2019). Estas duas ações são primordiais para que uma companhia consiga alcançar seus objetivos e manter-se competitiva no seu respectivo mercado de atuação.

A detecção e eliminação dos desperdícios se dá diante não somente a partir da sua detecção, mas também por meio do redesenho de processos e adoção do Mapeamento do Fluxo de Valor, técnica esta que permite que a companhia identifique e em seguida gerencie adequadamente cada desperdício existente em suas operações (Nicholas, 2010). Com isso, as organizações se tornam mais cônscias da necessidade de produzirem com qualidade, o que lhes permitirá o alcance do melhor desempenho, bem como de sua sustentabilidade financeira (Das & Mitra, 2018; Yordanova-Dinova, 2019).

Pode-se considerar que tanto as ações voltadas para a melhoria contínua dos processos como também a expurgação dos desperdícios representa eixos estruturantes tanto para o incremento dos resultados organizacionais como também para a criação de valor aos clientes (Alkunsol, Sharabati, AlSalhi & El-Tamini, 2019). Estes são efeitos que podem ser produzidos por meio da utilização assertiva dos recursos disponíveis. Silva (2019) esclarece que a ideia de recursos não se limita somente a dinheiro, posto que pessoas, trabalho, espaços físicos e tecnologia também são recursos a serem gerenciados com vistas ao alcance de objetivos organizacionais. Oliveira e Nascimento-e-Silva (2020) atrelam a questão da necessidade de administração de recursos não somente do ponto de vista econômico, mas também mercadológico, posto que as organizações que conseguem gerenciar corretamente seus recursos acabam obtendo o diferencial competitivo no seu respectivo ambiente de mercado.

Todavia, é necessário ponderar que o sucesso na adoção dos princípios do Lean Management depende da participação das pessoas envolvidas nos processos a serem melhorados. Há estudos que reconhecem que a participação como fenômeno social implica reconhecer que todos os integrantes de um grupo ou comunidade possuem a prerrogativa de opinar, decidir e assumir os efeitos de suas deliberações (Borges, Silva & Nascimento-e-Silva, 2020; Nascimento-e-Silva, Brito & Silva, 2022; Oliveira & Nascimento-e-Silva, 2020; Valle, Nascimento-e-Silva & Silva, 2020). Por esta razão, o estudo feito por Batista et al. (2021) assevera que a liderança é um dos elementos primordiais no que se refere a adoção e continuidade das ações pertinentes ao Lean Management, uma vez que o insucesso de projetos voltados a esta natureza está vinculado ao foco voltado somente para processos, sem considerar as pessoas que neles trabalham.

Assim, pode-se inferir que Lean Management representa não somente um conjunto de técnicas, mas sim de atitudes voltadas para o alcance da excelência nas organizações (Ramakrishna & Alzoubi, 2022). O fato de o Lean Management ter em sua essência o aspecto cultural, o qual faz com que as pessoas tenham de adotar novas posturas com relação ao seu cotidiano de trabalho conferem a este conceito a característica da complexidade (Klein et al., 2022). Para isto há explicação plausível: o sucesso do Lean Management depende do comprometimento das pessoas, as quais são o recurso mais melindroso e difícil de ser gerenciado (Silva, 2019). Ainda assim, é possível por meio da aplicação correta dos ditames atinentes ao Lean Management o alcance de resultados mais profícuos no que tange a produtividade e a qualidade das tarefas desenvolvidas, fator este que fortalece o desempenho organizacional (Perdomo-Verdeia, Sacristán-Diaz & Garrido-Vega, 2022; Slack et al., 2009).

Feitos estes apontamentos, é conveniente conhecer os aspectos teóricos conexos ao Lean Office. Cardoso e Alves (2013) explanam inicialmente as seguintes características desta vertente do Lean Management: a) os enfoques básicos são os mesmos, do conceito geral de Lean, voltados para a eliminação de desperdícios e melhoria contínua; b) o fluxo de valor não é visto sob processos fabris, mas sim focalizado nas áreas administrativas, e; c) as atividades de prestação de serviços também são consideradas neste diapasão como áreas administrativas. Em complemento a esta fala, é oportuno dizer sobre a pertinência e magnitude do Lean Office para o sucesso das companhias, posto que consoante Tapping e Shuker (2010), 60% a 80% dos custos pertinentes ao atendimento das demandas dos clientes estão concentrados em funções administrativas. Na interpretação de Danielson (2013), este percentual chega a ser entre 50% a 80% dos custos de atendimento de demanda.

Entretanto, a aplicabilidade dos processos de Lean voltada para escritórios não é uma tarefa das mais fáceis. Isto porque consoante os estudos de Carneiro, Costa, Jardim, Viana e Santos (2016) e Cardoso e Alves (2013), a maior parte dos fluxos é informacional, o que pode tornar mais dificultosa a detecção dos desperdícios. Por esta razão, numa perspectiva voltada para a prática do Lean Office, as atividades devem ser devidamente estudadas com vistas a detecção dos desperdícios existentes. Uma forma de se assegurar isto é o mapeamento de processos. Esta ferramenta deve ser utilizada também no âmbito dos escritórios com vistas a perceber quais tarefas não possuem valor agregado. Por meio da aplicação desta visão por processos, torna-se possível detectar as atividades que não são producentes e com isso tornar o local de trabalho mais assertivo e apto a gerar melhores produtos com redução de tempo e de custos (Devaney, 2010).

São muitos os benefícios oriundos da identificação dos desperdícios nos escritórios por meio do mapeamento de processos. Segundo Devaney (2010), estas benesses são: a) visualização dos fluxos de trabalho; b) percepção e gerenciamento adequado das causas dos desperdícios; c) entendimento da linguagem conexa aos processos; d) criação de uma adesão dos colaboradores para o sucesso na redução dos desperdícios, e; e) os resultados do mapeamento representam a base para a implementação de projetos de melhoria contínua. O estudo de Pontes, Silva, Martins, Santos e Silveira (2019) relata que as primeiras experiências práticas do Lean Office são datadas dos anos 1970 e tinham como intuito a melhoria da performance das empresas prestadoras de serviços.

Assim como acontece no contexto do Lean Management ou Lean Manufacturing, na seara do Lean Office a questão da participação e comprometimento das pessoas é deveras relevante. Neste sentido, evidencia-se a necessidade de treinamento de funcionários para que a prática do Lean Office seja a mais exitosa possível. Isto faz sentido, posto que primeiramente a essência dos conceitos associados ao Lean Management precisa ser internalizada pelos funcionários para que então se possa criar as bases e implementar na prática o Lean Office (Murakami, 2012).

Entretanto, o aspecto da complexidade presente no que se refere a aplicabilidade do Lean Manufacturing (Klein et al., 2022) também é uma característica do Lean Office. Dentre as razões que corroboram para que isto ocorra, pode-se elencar: a) os processos administrativos possuem etapas intangíveis, diferentemente do que se vê nos processos fabris, e; b) as atividades administrativas nem sempre seguem um padrão determinado e isto acaba dificultando a detecção dos desperdícios (Locher, 2011; Tapping & Shuker, 2010). Em complemento a esta fala, Melara, Lima e Souza (2017) diz que este aspecto da intangibilidade de algumas atividades administrativas acaba dificultando a criação do mapa de fluxo de valor, posto que a feitura deste processo de forma equivocada pode comprometer todo o resultado do departamento ou da organização como um todo.

Este entendimento básico do que seja o Lean adaptado aos processos administrativos requer também que os colaboradores conheçam e saibam identificar e tratar os desperdícios que podem comprometer a eficiência e eficácia da organização. Por esta razão, Tapping e Shuker (2010) fizeram a adaptação dos 7 desperdícios que são costumeiramente associados ao Lean Management para a realidade do Lean Office. É oportuno reconhecer que a ausência de combate a estes desperdícios prejudica o bom andamento dos processos e faz com que tempo e demais recursos não sejam aproveitados de maneira profícua. Com isso, atividades que não agregam valor e evitam que os produtos ou serviços sejam entregues em menos tempo continuam sendo desempenhadas e assim comprometendo o alcance da excelência em processos (Graban, 2013).

Nesse contexto, os sete desperdícios do Lean Office são:

Superprodução: Produzir informação ou papel mais ou antes do tempo necessário, como, por exemplo: cópias, relatórios, esperar alguma atividade ser feita, dente outros/

Processos redundantes: Inclui redundâncias, como, por exemplo, várias assinaturas num mesmo documento, revisar o trabalho feito por terceiros, etc.

Estoque: Está atrelado ao excesso de materiais, como, por exemplo, arquivos e cópias desnecessárias.

Movimento: Se refere a qualquer movimento desnecessário a tarefa a ser realizada, como, por exemplo, layout ineficiente entre os setores.

Defeitos ou Retrabalho: Produção de tarefas com defeito, o que abarca necessidade de retrabalho, desperdício de recursos, horas extras, etc.

Transporte: Transportar, arquivar ou movimentar materiais de maneira excessiva, informações ou papéis que demandam tempo e energia.

Como se pode perceber, são muitas as oportunidades de melhorias a serem trabalhadas numa perspectiva de trabalho voltada para o Lean Office. Todavia, a implementação desta forma de trabalho pautada na redução de desperdícios e busca incessante pelo aprimoramento dos processos deve ser feita de maneira coordenada e planejada. Conforme sugerido por Freitag, Santos e Reis (2018), uma forma recomendável de se iniciar a implementação do Lean Office é não efetuar este processo em todas as atividades administrativas, mas sim iniciar com um número reduzido de atividades e pessoas, as quais irão ganhar experiência e poderão futuramente serem multiplicadoras das benesses que o Lean Office pode gerara para a organização.


No que tange aos projetos voltados ao Lean Office, consoante Danielsson (2013), pode-se trabalhar com duas perspectivas, a saber:

- A primeira delas é chamada de Lean Office Neo-Taylorística e se caracteriza por ter sua aplicação numa abordagem de cunho científico de maneira que os processos administrativos passem por um processo de padronização (Borges et al., 2020). A consecução deste objetivo exige que determinados parâmetros sejam estabelecidos, como, por exemplo, o uso do material estritamente necessário para a realização das tarefas e evitar que o empregado customize o modus operandi exigido aos processos administrativos. As decisões são tomadas no nível gerencial, cabendo ao time operacional somente obedecer às ordens emitidas pela sua respectiva liderança.

- A segunda perspectiva é o Lean Office voltado para equipes e possui como eixo sustentáculo a ideia das “organizações que aprendem”, cujo enfoque é voltado para a solução de problemas (Senge, 2012). Neste diapasão, faz-se necessária a existência de colaboradores que sejam mais autônomos e possuam responsabilidade tanto em nível individual como também coletivo. Além disso, é necessário que tenha a figura do supervisor que se responsabilize pelos resultados da equipe. Outro ponto a ser mencionado é o aspecto relacional consistente, com objetivos bem definidos. Na perspectiva do Lean Office voltado para equipes a liderança representa uma função sine qua non para o alcance da excelência nos processos administrativos (Freitag et al., 2018).

Sendo assim, as diferenças entre processos produtivos e processos administrativos são:

Valor: Processos Produtivos - Objetivos definidos e visíveis em cada etapa; Processos Administrativos - Objetivos diferentes, difíceis de serem detectados

Fluxo de Valor: Processos produtivos - Materiais e peças; Processos Administrativos - Informação e conhecimento

Fluxo: Processos produtivos - As interações são um desperdício; Processos Administrativos - As interações planejadas devem ser eficientes

Puxada: Processos Produtivos - Guiada pelo Takt Time; Processos Administrativos - Guiada pelas necessidades da companhia

Perfeição: Processos Produtivos - Repetição dos processos sem erros; Processos Administrativos - Os processos permitem a melhoria contínua da organização

Como se pode observar, os processos produtivos se notabilizam por serem mais passíveis de serem mensurados e racionalizados. As metas são bem definidas e a orientação voltada para o alcance da excelência em processos se mostra congruente com o princípio da melhoria contínua (Graban, 2013). Nesta perspectiva, quanto mais os operadores executam suas tarefas, ganham mais expertise e podem então passar a detectar eventuais desperdícios com vistas a tornar ainda mais profícuo o seu trabalho. Já no que tange aos processos administrativos, estes também podem ser aprimorados diante do atendimento a determinados fatores condicionantes, sendo a participação das pessoas um dos principais objetivos a serem alcançados.

Por esta razão, tanto o Lean Manufacturing como o Lean Office possuem o aspecto da complexidade (Klein et al. 2022). Neste sentido, a liderança é um elemento primordial para o sucesso da implementação de projetos voltados a prática do Lean Office. Silva (2019) esclarece que a liderança é uma subfase do processo de direção e sua execução não é uma tarefa das mais simples pelo fato de o líder ter que influenciar e engajar o recurso mais difícil de ser administrado: as pessoas. Todavia, mediante a suplantação deste obstáculo, a companhia se habilita a conseguir melhores resultados em seu âmbito de atuação e assim manter-se mais competitiva no seu respectivo ambiente de mercado.