segunda-feira, 9 de março de 2015

As Problemáticas dos Processos de Recrutamento e Seleção

As relações candidatos, headhunters e empresas estão adequadas para Recrutar e Selecionar o melhor profissional para uma determinada função? Como identificar a pessoa certa para o lugar certo nas empresas? Vale a pena terceirizar esse processo? Ou seria melhor capacitar a área de Recursos Humanos das próprias empresas para realizar esse processo? Quais os processos mais adequados?
Para responder essas e outras perguntas, que é atualmente uma problemática recorrente entre candidatos, empresas e headhunters, fiz recentemente uma pesquisa informal para saber quais as percepções das pessoas envolvidas nesse processo. Para a minha surpresa, encontrei comentários que na sua maioria eram mais queixas e justificativas de todos os lados. Dentre eles, destaco as seguintes:
Alguns candidatos comentam que há tantos testes que até parece que estão concorrendo para uma vaga na NASA (agência espacial americana). Já os selecionadores justificam que o excesso de testes é para reduzir a margem de erro na escolha de um candidato. Outros afirmam que apesar de tantos testes ainda é possível errar nas contratações. Segundo os mesmos, contrata-se pelas competências avaliadas, porém demite-se pelo comportamento. Na contramão, outros rebatem esse último comentário dizendo que assim estariam desqualificando os testes comportamentais e psicológicos que são aplicados.
Alguns candidatos reclamam que somente são chamados pelos headhunters aqueles que pagam pelo processo de recolocação. Portanto, quem não paga está fora das oportunidades e vagas. Esse ponto é ainda mais grave nos níveis de executivos (gerentes e diretores), pois é onde os salários são mais altos.
Alguns candidatos relatam que foram penalizados por falsas referências coletadas, sem que a verdade dos fatos fosse realmente verificada. Já os headhunters consideram que o tempo e a pressão por parte das empresas é um problema para que os processos sejam executados com a devida qualidade necessária.
Alguns headhunters consideram relevante o tempo de trabalho em cada empresa. Fato esse que já elimina o candidato sem mesmo chamá-lo para uma conversa, pois esse candidato é considerado instável. Outros headhunters não concordam com essa visão, pois, afirmam que assim estariam eliminando candidatos com grande potencial sem a devida consideração pelas experiências vivenciadas e os resultados entregues. Outros headhunters também ratificam essa situação, uma vez que grande parte dos atuais executivos não passa mais que 02 anos na mesma empresa. Outros afirmam que essa é uma determinação das empresas, portanto, apenas seguem os requisitos solicitados pela empresa solicitante.
Já os candidatos nessa situação reclamam, pois, em muitos casos, o tempo curto não significa instabilidade, mas sim situações de projetos ou acontecimentos que estão fora do controle do candidato, tal como falência da empresa, reestruturação devido a problemas financeiros e mercadológicos, entre outros.
Alguns candidatos reclamam da falta de feedback por parte dos headhunters. Já os headhunters se defendem dizendo que não há como dar feedback para todos, pois a quantidade de processos é muito grande. Outros ainda dizem que realizam o feedback apenas para as vagas executivas, as operacionais ficam mesmo sem o feedback.
Alguns headhunters consideram o atraso na hora marcada para as entrevistas um fator relevante e que elimina candidatos antes mesmo da entrevista começar. Já os candidatos reclamam que a contrapartida é pior, pois, muitas vezes, ficam esperando até horas após o horário marcado pelo selecionador. Há ainda aqueles que afirmam que muitos selecionadores não tem a devida competência para realizar o processo de R&S.
Na realidade, o que se observa é que não há certos e errados. Para mim, não há um candidato ruim e outro melhor. O que há de fato é aquele candidato que mais se aproxima do perfil desejado pela vaga e outro que está mais distante. Portanto, todos são bons candidatos e pretendentes a vaga.
Ocorre que muitos são descartados pela simples avaliação preliminar do recrutador que, na maioria dos casos, não é a pessoa mais adequada para eliminar um candidato, mas sim aquele que realmente estará contratando dentro da empresa e dono da vaga. Vejam que são muitas as observações (queixas e justificativas). Contudo, quero agora dar um exemplo prático de um processo que eu participei. Para mim, esse sim seria um processo de R&S mais adequado.
O evento ocorreu em uma empresa multinacional e a vaga era para Gerente Industrial. Vale ressaltar que esse processo foi conduzido de forma combinada entre um headhunter e o próprio departamento de Recursos Humanos da empresa. Nesse caso, todas as etapas convencionais foram aplicadas (testes e entrevistas). No entanto, um processo em particular ficou na minha memória, isto é, após os devidos testes e entrevistas, o Diretor Residente Expatriado, que só falava o inglês, solicitou uma conversa adicional comigo.
A novidade foi que o Diretor pediu para que eu fosse com ele no chão de fábrica e assim observasse a tudo e a todos, a fim de identificar situações que eu julgava estar erradas. Ocorre que ele teria apenas 30min para fazer essa caminhada comigo. Portanto, eu deveria ser bastante direto e claro nas minhas observações, além de dizer quais seriam as possíveis soluções para aqueles problemas que eu estaria apontando.
Começamos nossa caminhada pela fábrica e passando rapidamente por todos os processos. Conforme ele (Diretor) me mostrava às etapas dos processos de fabricação, em minha mente anotava tudo o que constatava de irregular. No final, antes de voltarmos para a sala de reuniões, ele parou em frente a um quadro com alguns indicadores de desempenho e solicitou para que eu observasse atentamente, pois também gostaria de saber meus comentários sobre o tal quadro.
Após os 30min, já de volta a sala de reuniões, o Diretor me fez a seguinte pergunta direta: “Quais foram os problemas que você (Marcelo) viu?”. Minha resposta foi também direta, pois fui relatando tudo o que pude ver em apenas 30min. Vale ressaltar que relatei não somente os problemas, mas também as prováveis causas e as soluções. Os tais erros que eu identifiquei foram os seguintes:
Notei muitos operadores de produção andando pela fábrica. Quando isso ocorre, é possível que esteja ocorrendo uma ociosidade no balanceamento da capacidade produtiva nas linhas de produção. A consequência é um excesso de mão de obra que acaba “sobrando”. Essa ociosidade acaba proporcionando tempo ocioso para que alguns andem pela fábrica sem um objetivo específico.
Havia também excesso de materiais e estoque dentro da área produtiva. Outra evidência de colaborava com minha observação de que realmente havia um desbalanceamento de capacidade entre os processos. O excesso de estoque acaba escondendo a ineficiência dos processos, além de esconder possíveis defeitos acumulados que somente serão identificados dias após a produção inicial devido ao excesso de estoque acumulado. Portanto, necessidade urgente de um estudo para balancear a capacidade e os recursos dos processos.
Havia também muitos componentes empilhados de forma irregular e em grandes quantidades. Essa situação poderia causar danos às embalagens e nos componentes. O resultado dessa condição poderia danificar os componentes e assim comprometer a qualidade dos mesmos quando alimentados às máquinas ou linhas de montagem.
Para essa situação, recomendei a aquisição de prateleiras/carros para estocar e transportar os componentes. Poderia ser carros, tipo prateleiras, que serviriam como vai e vem entre o almoxarifado e a área de produção. Dessa forma, evita-se o excesso de estoque na produção e ainda caixas de papelão que transferem pó e sujeira para dentro do ambiente produtivo.
Esse excesso de estoque poderia ainda estar acompanhado da falta de controle do PEPS (primeiro que entra é o primeiro que sai), além de um controle de transferência de saldo no sistema MRP (algo do tipo via scanner e código de barras). Vejam que esse problema é grave, pois pode gerar danos relevantes ao controle de inventário e contábil da empresa.
Nesse caso, recomendei a implementação do PEPS de forma visual e por etiquetas com cores. Esse controle ajuda no giro adequado do estoque, bem como no controle da exposição de alguns componentes sensíveis a temperatura e a umidade. Como não vi nenhum controle, recomendei implementar um leitor de código de barras para automatizar o controle de estoque e a acuracidade de inventário.
É claro que mencionei que o excesso de estoque está diretamente ligado com o custo da manutenção desses estoques, além do custo da não qualidade devido aos constantes retrabalhos realizados.
Falando em retrabalhos, observei que em vários pontos dos processos havia pilhas de defeitos que eram chamados de bone pile (pilhas de ossos). Nesses casos, observei que havia uma clara evidência de que o processo estava fora de controle. Nesse caso, uma falta de controle do processo em relação à qualidade. Portanto, uma falha sistemática e operacional para identificar, classificar e solucionar defeitos. Algumas ferramentas básicas do tipo: ciclo PDCA, 5 porquês, gráfico de pareto, 5w1h, espinha de peixe e outros (ex: ferramentas da qualidade).
Lembram do quadro de indicadores de desempenho? Aquele que o Diretor pediu para que eu observasse atentamente? Na realidade, o quadro era bonito e com vários gráficos e planos, porém, estava ali apenas para cumprir um requisito da norma ISO9001. Na verdade, os indicadores não representavam a realidade no chão de fábrica. Os dados estavam desatualizados e os planos sem uma ação preventiva efetiva. Na verdade, minha percepção era que nessa empresa havia uma cultura do tipo "varrer a sujeira para debaixo do tapete". Uma cultura de tolerância às falhas e perdas de todo tipo, além do constante combate aos “incêndios”. O que parece é que as pessoas estavam acostumadas a agir de forma reativa e não proativamente.
É claro que à condição dos 5s nas áreas era ruim. Na realidade essa condição é muito comum nas empresas que apresentam essas condições. Nas organizações onde as bases dos 5s não se aplicam, é difícil manter funcionando outras atividades e controles de processo dentro de padrões aceitáveis. Nesse ponto, gosto muito das empresas orientais, pois os 5s são tomados como um plano sério a ser seguido por todos, inclusive pelo exemplo do próprio presidente da empresa.
Outro ponto interessante, observado durante a caminhada, foi o uso da pulseira antiestática que alguns operadores não usavam. Essa condição é causa comum de grandes perdas nas empresas do ramo eletroeletrônico, pois é um vilão invisível que causa danos sem uma causa aparente. Lembram do bone pile que observei em vários pontos da fábrica?. Essa talvez seja uma das causas relevantes que pode explicar a grande quantidade das pilhas de defeitos acumulados.
Nesse caso, recomendei orientar os operadores quanto à importância do teste da pulseira antiestática todas as vezes que adentrarem o ambiente produtivo. Também realizar um treinamento de sensibilização sobre a Descarga Eletrostática (ESD) para todos os funcionários. É fato que a empresa estava falhando em um programa de auditoria interna para verificar as condições de proteção ESD de forma continuada.
Ainda sobre o quadro de indicadores, observei que a fábrica perdia muito em seu plano de produção devido às várias paradas inesperadas. Dentre elas, observei que as maiores causas eram as paradas por falta de materiais e as paradas por quebra de máquinas.
Somente nessas duas observações, pude perceber que havia um claro problema de planejamento entre a demanda (Forecast) e suprimentos. É claro que essa era uma visão superficial, pois eu não tive tempo para analisar as reais causas desse problema da falta de materiais. Nesse caso, uma reunião periódica do PCPM (Planejamento e Controle da Produção e Materiais) com as áreas responsáveis poderá antecipar as paradas inesperadas.
Lembram dos excessos de defeitos e o descontrole de estoque? Esses também podem ser causa da falta inesperada de materiais, pois, o sistema MRP (software para planejamento da produção e materiais) pode estar acusado saldo de um item que na realidade não existe. É muito comum nas empresas a falta de atualização do sistema MRP para os casos de perdas, o que acaba sendo ajustado quando na ocasião do inventário geral. Nesses casos, recomendei que fosse implementado um inventário cíclico e ainda uma rotina diária e disciplinada para dar baixa das perdas no sistema.
Em relação às paradas por quebra de equipamento, percebi que havia uma clara evidência da falta de planos adequados para a estratégia da manutenção. Na realidade, é comum nas empresas que as atividades e os planos de manutenção sejam negligenciados. É provável que devido as constantes perdas de produção, os planos de manutenção sejam simplesmente abortados. Dessa forma, criando um ciclo vicioso de perdas que nunca se resolve.
A minha surpresa foi que o Diretor não me interrompeu em nenhum momento. Pelo contrário, ficou atento a tudo o que eu falava. Na verdade, não pude fazer nenhuma leitura se ele realmente estava gostando ou não. Contudo, pensei comigo mesmo, se não estivesse gostando, já teria pedido para eu parar de falar.
Ocorre que após o meu relato de tudo o que pude ver em 30min, o diretor simplesmente sorriu e disse que era exatamente o que ele esperava ouvir de mim. Na realidade, ele confirmou todas as situações que eu havia identificado. O diretor ainda comentou que esperava contratar um profissional que falasse sempre a verdade dos fatos e que não escondesse as situações, mesmo que fossem ruins.
Ele comentou que desejava contratar alguém com uma visão sistêmica do todo, porém, com uma capacidade analítica para propor soluções. Alguém que pudesse estabelecer um processo de melhoria contínua baseado em indicadores de desempenho reais. Alguém que pudesse obter os resultados por meio das pessoas, estimulando a disciplina em fazer o certo. Alguém que pudesse enxergar as oportunidades de melhorar a eficiência e a eficácia dos processos, fazendo mais com menos. Um gerente de fato!
A conclusão final é que fui contratado e comecei a colocar em prática tudo o que eu havia sinalizado naqueles 30min. No entanto, qual foi à lição aprendida nessa história real que vivi? Para mim, não importa quem irá conduzir os processos de R&S? Seja a própria empresa ou headhunters. No entanto, não se pode negar que há sim problemas e oportunidades de melhorias para a qualidade nas relações candidatos, headhunters e empresa. Há sim oportunidades de melhorias para a condução dos processos de R&S. Vale ressaltar, que esses entraves nas relações dos envolvidos podem causar grandes perdas e danos para todos os lados envolvidos.
O exemplo do diretor expatriado me fez perceber que os testes e as entrevistas representam um percentual extremamente pequeno para a decisão mais acertada entre um candidato ou outro. Esse exemplo me fez ver que o mais importante é exatamente o que os técnicos de futebol fazem quando na escolha de um jogador.
Os técnicos de futebol determinam sua escolha não somente em testes teóricos, mas também colocando o jogador para jogar. É em campo, jogando, que se pode ver o real potencial de um candidato. Quando se observa alguém jogando, é quando se tem a real percepção do potencial dessa pessoa. Dessa forma, baseamos nossas decisões naquilo que vemos como resultados práticos daquilo que o candidato poderá entregar para e empresa.