As relações candidatos, headhunters e empresas estão adequadas para
Recrutar e Selecionar o melhor profissional para uma determinada função? Como identificar
a pessoa certa para o lugar certo nas empresas? Vale a pena terceirizar esse
processo? Ou seria melhor capacitar a área de Recursos Humanos das próprias empresas
para realizar esse processo? Quais os processos mais adequados?
Para responder essas e outras perguntas, que é atualmente uma
problemática recorrente entre candidatos, empresas e headhunters, fiz
recentemente uma pesquisa informal para saber quais as percepções das pessoas envolvidas
nesse processo. Para a minha surpresa, encontrei comentários que na sua maioria
eram mais queixas e justificativas de todos os lados. Dentre eles, destaco as
seguintes:
Alguns candidatos comentam que há tantos testes que até parece que estão
concorrendo para uma vaga na NASA (agência espacial americana). Já os
selecionadores justificam que o excesso de testes é para reduzir a margem de
erro na escolha de um candidato. Outros afirmam que apesar de tantos testes
ainda é possível errar nas contratações. Segundo os mesmos, contrata-se pelas competências
avaliadas, porém demite-se pelo comportamento. Na contramão, outros rebatem
esse último comentário dizendo que assim estariam desqualificando os testes
comportamentais e psicológicos que são aplicados.
Alguns candidatos reclamam que somente são chamados pelos headhunters aqueles
que pagam pelo processo de recolocação. Portanto, quem não paga está fora das
oportunidades e vagas. Esse ponto é ainda mais grave nos níveis de executivos
(gerentes e diretores), pois é onde os salários são mais altos.
Alguns candidatos relatam que foram penalizados por falsas referências
coletadas, sem que a verdade dos fatos fosse realmente verificada. Já os
headhunters consideram que o tempo e a pressão por parte das empresas é um
problema para que os processos sejam executados com a devida qualidade
necessária.
Alguns headhunters consideram relevante o tempo de trabalho em cada
empresa. Fato esse que já elimina o candidato sem mesmo chamá-lo para uma
conversa, pois esse candidato é considerado instável. Outros headhunters não
concordam com essa visão, pois, afirmam que assim estariam eliminando
candidatos com grande potencial sem a devida consideração pelas experiências
vivenciadas e os resultados entregues. Outros headhunters também ratificam essa
situação, uma vez que grande parte dos atuais executivos não passa mais que 02
anos na mesma empresa. Outros afirmam que essa é uma determinação das empresas,
portanto, apenas seguem os requisitos solicitados pela empresa solicitante.
Já os candidatos nessa situação reclamam, pois, em muitos casos, o tempo
curto não significa instabilidade, mas sim situações de projetos ou
acontecimentos que estão fora do controle do candidato, tal como falência da
empresa, reestruturação devido a problemas financeiros e mercadológicos, entre
outros.
Alguns candidatos reclamam da falta de feedback por parte dos
headhunters. Já os headhunters se defendem dizendo que não há como dar feedback
para todos, pois a quantidade de processos é muito grande. Outros ainda dizem
que realizam o feedback apenas para as vagas executivas, as operacionais ficam mesmo
sem o feedback.
Alguns headhunters consideram o atraso na hora marcada para as
entrevistas um fator relevante e que elimina candidatos antes mesmo da
entrevista começar. Já os candidatos reclamam que a contrapartida é pior, pois,
muitas vezes, ficam esperando até horas após o horário marcado pelo
selecionador. Há ainda aqueles que afirmam que muitos selecionadores não tem a
devida competência para realizar o processo de R&S.
Na realidade, o que se observa é que não há certos e errados. Para mim, não há um
candidato ruim e outro melhor. O que há de fato é aquele candidato que mais se
aproxima do perfil desejado pela vaga e outro que está mais distante. Portanto,
todos são bons candidatos e pretendentes a vaga.
Ocorre que muitos são descartados pela simples avaliação preliminar do recrutador
que, na maioria dos casos, não é a pessoa mais adequada para eliminar um
candidato, mas sim aquele que realmente estará contratando dentro da empresa e
dono da vaga. Vejam que são muitas as observações (queixas e justificativas). Contudo,
quero agora dar um exemplo prático de um processo que eu participei. Para mim, esse
sim seria um processo de R&S mais adequado.
O evento ocorreu em uma empresa multinacional e a vaga era para Gerente
Industrial. Vale ressaltar que esse processo foi conduzido de forma combinada entre um headhunter e o próprio departamento de Recursos Humanos da empresa. Nesse caso, todas as
etapas convencionais foram aplicadas (testes e entrevistas). No entanto, um
processo em particular ficou na minha memória, isto é, após os devidos testes e
entrevistas, o Diretor Residente Expatriado, que só falava o inglês, solicitou
uma conversa adicional comigo.
A novidade foi que o Diretor pediu para que eu fosse com ele no chão de
fábrica e assim observasse a tudo e a todos, a fim de identificar situações que
eu julgava estar erradas. Ocorre que ele teria apenas 30min para fazer essa
caminhada comigo. Portanto, eu deveria ser bastante direto e claro nas minhas
observações, além de dizer quais seriam as possíveis soluções para aqueles
problemas que eu estaria apontando.
Começamos
nossa caminhada pela fábrica e passando rapidamente por todos os processos. Conforme
ele (Diretor) me mostrava às etapas dos processos de fabricação, em minha mente
anotava tudo o que constatava de irregular. No final, antes de voltarmos para a
sala de reuniões, ele parou em frente a um quadro com alguns indicadores de
desempenho e solicitou para que eu observasse atentamente, pois também gostaria
de saber meus comentários sobre o tal quadro.
Após os
30min, já de volta a sala de reuniões, o Diretor me fez a seguinte pergunta
direta: “Quais foram os problemas que você (Marcelo) viu?”. Minha resposta foi
também direta, pois fui relatando tudo o que pude ver em apenas 30min. Vale
ressaltar que relatei não somente os problemas, mas também as prováveis causas
e as soluções. Os tais erros que eu identifiquei foram os seguintes:
Notei muitos
operadores de produção andando pela fábrica. Quando isso ocorre, é possível que
esteja ocorrendo uma ociosidade no balanceamento da capacidade produtiva nas
linhas de produção. A consequência é um excesso de mão de obra que acaba
“sobrando”. Essa ociosidade acaba proporcionando tempo ocioso para que alguns
andem pela fábrica sem um objetivo específico.
Havia
também excesso de materiais e estoque dentro da área produtiva. Outra evidência
de colaborava com minha observação de que realmente havia um desbalanceamento de
capacidade entre os processos. O excesso de estoque acaba escondendo a
ineficiência dos processos, além de esconder possíveis defeitos acumulados que
somente serão identificados dias após a produção inicial devido ao excesso de
estoque acumulado. Portanto, necessidade urgente de um estudo para balancear a
capacidade e os recursos dos processos.
Havia também
muitos componentes empilhados de forma irregular e em grandes quantidades. Essa
situação poderia causar danos às embalagens e nos componentes. O resultado
dessa condição poderia danificar os componentes e assim comprometer a qualidade
dos mesmos quando alimentados às máquinas ou linhas de montagem.
Para
essa situação, recomendei a aquisição de prateleiras/carros para estocar e
transportar os componentes. Poderia ser carros, tipo prateleiras, que serviriam
como vai e vem entre o almoxarifado e a área de produção. Dessa forma, evita-se
o excesso de estoque na produção e ainda caixas de papelão que transferem pó e
sujeira para dentro do ambiente produtivo.
Esse excesso
de estoque poderia ainda estar acompanhado da falta de controle do PEPS
(primeiro que entra é o primeiro que sai), além de um controle de transferência
de saldo no sistema MRP (algo do tipo via scanner e código de barras). Vejam
que esse problema é grave, pois pode gerar danos relevantes ao controle de
inventário e contábil da empresa.
Nesse
caso, recomendei a implementação do PEPS de forma visual e por etiquetas com cores.
Esse controle ajuda no giro adequado do estoque, bem como no controle da
exposição de alguns componentes sensíveis a temperatura e a umidade. Como não
vi nenhum controle, recomendei implementar um leitor de código de barras para
automatizar o controle de estoque e a acuracidade de inventário.
É claro
que mencionei que o excesso de estoque está diretamente ligado com o custo da
manutenção desses estoques, além do custo da não qualidade devido aos constantes
retrabalhos realizados.
Falando
em retrabalhos, observei que em vários pontos dos processos havia pilhas de
defeitos que eram chamados de bone pile
(pilhas de ossos). Nesses casos, observei que havia uma clara evidência de que
o processo estava fora de controle. Nesse caso, uma falta de controle do
processo em relação à qualidade. Portanto, uma falha sistemática e operacional
para identificar, classificar e solucionar defeitos. Algumas ferramentas
básicas do tipo: ciclo PDCA, 5 porquês, gráfico de pareto, 5w1h, espinha de
peixe e outros (ex: ferramentas da qualidade).
Lembram
do quadro de indicadores de desempenho? Aquele que o Diretor pediu para que eu
observasse atentamente? Na realidade, o quadro era bonito e com vários gráficos
e planos, porém, estava ali apenas para cumprir um requisito da norma ISO9001. Na
verdade, os indicadores não representavam a realidade no chão de fábrica. Os
dados estavam desatualizados e os planos sem uma ação preventiva efetiva. Na
verdade, minha percepção era que nessa empresa havia uma cultura do tipo
"varrer a sujeira para debaixo do tapete". Uma cultura de tolerância
às falhas e perdas de todo tipo, além do constante combate aos “incêndios”. O
que parece é que as pessoas estavam acostumadas a agir de forma reativa e não
proativamente.
É claro
que à condição dos 5s nas áreas era ruim. Na realidade essa condição é muito
comum nas empresas que apresentam essas condições. Nas organizações onde as
bases dos 5s não se aplicam, é difícil manter funcionando outras atividades e controles
de processo dentro de padrões aceitáveis. Nesse ponto, gosto muito das empresas
orientais, pois os 5s são tomados como um plano sério a ser seguido por todos,
inclusive pelo exemplo do próprio presidente da empresa.
Outro
ponto interessante, observado durante a caminhada, foi o uso da pulseira
antiestática que alguns operadores não usavam. Essa condição é causa comum de grandes perdas nas empresas do ramo eletroeletrônico, pois é um vilão
invisível que causa danos sem uma causa aparente. Lembram do bone pile que observei em vários pontos
da fábrica?. Essa talvez seja uma das causas relevantes que pode explicar a grande
quantidade das pilhas de defeitos acumulados.
Nesse
caso, recomendei orientar os operadores quanto à importância do teste da
pulseira antiestática todas as vezes que adentrarem o ambiente produtivo.
Também realizar um treinamento de sensibilização sobre a Descarga Eletrostática
(ESD) para todos os funcionários. É fato que a empresa estava falhando em um
programa de auditoria interna para verificar as condições de proteção ESD de
forma continuada.
Ainda
sobre o quadro de indicadores, observei que a fábrica perdia muito em seu plano
de produção devido às várias paradas inesperadas. Dentre elas, observei que as
maiores causas eram as paradas por falta de materiais e as paradas por quebra de máquinas.
Somente
nessas duas observações, pude perceber que havia um claro problema de
planejamento entre a demanda (Forecast) e suprimentos. É claro que essa era uma
visão superficial, pois eu não tive tempo para analisar as reais causas desse
problema da falta de materiais. Nesse caso, uma reunião periódica do PCPM
(Planejamento e Controle da Produção e Materiais) com as áreas responsáveis
poderá antecipar as paradas inesperadas.
Lembram
dos excessos de defeitos e o descontrole de estoque? Esses também podem ser
causa da falta inesperada de materiais, pois, o sistema MRP (software para
planejamento da produção e materiais) pode estar acusado saldo de um item que
na realidade não existe. É muito comum nas empresas a falta de atualização do
sistema MRP para os casos de perdas, o que acaba sendo ajustado quando na
ocasião do inventário geral. Nesses casos, recomendei que fosse implementado um
inventário cíclico e ainda uma rotina diária e disciplinada para dar baixa das perdas no sistema.
Em
relação às paradas por quebra de equipamento, percebi que havia uma clara evidência da falta de planos adequados para a estratégia da manutenção. Na
realidade, é comum nas empresas que as atividades e os planos de manutenção sejam
negligenciados. É provável que devido as constantes perdas de produção, os
planos de manutenção sejam simplesmente abortados. Dessa forma, criando um
ciclo vicioso de perdas que nunca se resolve.
A minha
surpresa foi que o Diretor não me interrompeu em nenhum momento. Pelo contrário,
ficou atento a tudo o que eu falava. Na verdade, não pude fazer nenhuma leitura
se ele realmente estava gostando ou não. Contudo, pensei comigo mesmo, se não
estivesse gostando, já teria pedido para eu parar de falar.
Ocorre
que após o meu relato de tudo o que pude ver em 30min, o diretor simplesmente
sorriu e disse que era exatamente o que ele esperava ouvir de mim. Na
realidade, ele confirmou todas as situações que eu havia identificado. O
diretor ainda comentou que esperava contratar um profissional que falasse sempre
a verdade dos fatos e que não escondesse as situações, mesmo que fossem ruins.
Ele comentou
que desejava contratar alguém com uma visão sistêmica do todo, porém, com uma
capacidade analítica para propor soluções. Alguém que pudesse estabelecer um
processo de melhoria contínua baseado em indicadores de desempenho reais.
Alguém que pudesse obter os resultados por meio das pessoas, estimulando a
disciplina em fazer o certo. Alguém que pudesse enxergar as oportunidades de
melhorar a eficiência e a eficácia dos processos, fazendo mais com menos. Um
gerente de fato!
A
conclusão final é que fui contratado e comecei a colocar em prática tudo o que eu
havia sinalizado naqueles 30min. No entanto, qual foi à lição aprendida nessa história
real que vivi? Para mim, não importa quem irá conduzir os processos de R&S? Seja
a própria empresa ou headhunters. No entanto, não se pode negar que há sim problemas e oportunidades de
melhorias para a qualidade nas relações candidatos, headhunters e empresa. Há
sim oportunidades de melhorias para a condução dos processos de R&S. Vale
ressaltar, que esses entraves nas relações dos envolvidos podem causar grandes
perdas e danos para todos os lados envolvidos.
O exemplo do diretor expatriado me fez perceber que os testes e as
entrevistas representam um percentual extremamente pequeno para a decisão mais
acertada entre um candidato ou outro. Esse exemplo me fez ver que o mais
importante é exatamente o que os técnicos de futebol fazem quando na escolha de
um jogador.
Os técnicos de futebol determinam sua escolha não somente em testes
teóricos, mas também colocando o jogador para jogar. É em campo, jogando, que
se pode ver o real potencial de um candidato. Quando se observa alguém jogando,
é quando se tem a real percepção do potencial dessa pessoa. Dessa forma,
baseamos nossas decisões naquilo que vemos como resultados práticos daquilo que
o candidato poderá entregar para e empresa.